segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

O inferno os espera

Acompanhando o depoimento de vários militares na Comissão Nacional da Verdade, criada pela presidente Dilma Rousseff para apurar as violações de direitos humanos durante a vigência do regime militar de 1964, não é possível ficar estarrecido com as informações de como agiam nos porões da ditadura. Assassinatos, torturas e mais diferentes violações eram práticas comuns cometidas por agentes da repressão. O resultado de tão macabra situação são inúmeros desaparecidos e marcas que atingem inúmeras pessoas até hoje no Brasil. 
O golpe de 64 no Brasil foi uma das maiores tragédias da história do País, junto com o período de escravidão. A intervenção militar, com a derrubada do presidente democraticamente eleito, João Goulart, cortou a possibilidade do Brasil dar um salto de qualidade no cenário mundial. O Brasil estava preparado para tal, com uma Constituição (a de 1946) extremamente democrática, e se houvesse continuidade na democracia brasileira, hoje seríamos um país do nível da Nova Zelândia e da Austrália. Entretanto, o golpe de 64, que durou 21 anos, mergulhou o País em trevas. 
Foi um período de noite e neblina. O Brasil conviveu com o pior que existe em ditaduras. As práticas de torturas, assassinatos, censura e falta de liberdade eram comuns. Foi um período em que determinadas pessoas que atuavam neste sistema ganharam fortunas em práticas de corrupção e agindo na penumbra do Estado. 
O que é mais terrível é observar hoje pessoas defendendo que os militares retornem. Tais pessoas são insanas e não têm noções do que é uma ditadura. Várias delas, inclusive, caso isso retornasse, jamais poderiam expor suas opiniões como fazem hoje. A democracia permite o burburinho próprio de uma sociedade que tenta encontrar caminhos para resolver seus problemas. 
Entretanto, tais assassinos e torturadores ficaram impunes, ao contrário do que aconteceu na Argentina, no Chile e no Uruguai, quando generais e outros militares de menores patentes foram para  a cadeia, vários deles, com prisões perpétuas. Tais militares cometeram crimes de lesa humanidade. No Brasil, para variar, houve uma conciliação, e aprovou-se uma Lei de Anistia, em 1979, que tinha basicamente a função de livrar os militares da punição. Esta lei foi acordada por setores do antigo MDB que fizeram uma grande conciliação, com Ulysses Guimarães à frente. O resultado disso é que vários assassinos e torturadores ainda hoje estão soltos relatando suas bravatas. 
O mais tenebroso disso tudo é que quando um País não pune aqueles que cometeram crimes de lesa humanidade, corre o risco de repetir a história, como vemos atualmente em determinados setores da sociedade que defendem a intervenção militar novamente. Nós deveríamos ter passado a limpo toda esta questão e mandado para a cadeia todos aqueles envolvidos em assassinatos e torturas em dependências do Estado. Na Argentina, por exemplo, a data do golpe militar de 1976 é feriado nacional, e neste dia, há várias manifestações pelo país como forma de mostrar a população do quanto terrível foi este episódio para a nação argentina. 
No Brasil, a Comissão Nacional da Verdade sofreu vários ataques, principalmente daqueles setores retrógrados envolvidos com os porões da ditadura e conservadores da sociedade. É terrível ouvir coronéis e generais defendendo aqueles tristes episódios. São senhores e anciões - e outros nem tanto assim - tentando justificar o injustificável. É importante lembrar que vários agentes da repressão - tanto civis quanto militares - tiveram fins terríveis. 
Vários foram assassinados como queima de arquivo ou morreram em circunstâncias difíceis. É só lembrar do coronel Paulo Malhães que foi assassinado recentemente em sua casa no Rio de Janeiro sob asfixia depois de relatar as barbáries que cometia contra prisioneiros políticos. Ou mesmo o coronel Jurandir, no Rio Grande do Sul, morto em um assalto a sua casa perpetrada por policiais militares que tentavam roubar suas armas. Ou então, o tenebroso delegado Sérgio Paranhos Fleury, morto em circunstâncias até hoje não esclarecidas quando "caiu de uma lancha e morreu afogado no litoral paulista". Na verdade, foram mortos com as mesmas estratégias utilizadas pelos agentes de repressão na época em que atuavam livremente. Ou seja, queima de arquivo. São acidentes e mortes simuladas. 
O que dá um certo conforto é que quando a justiça humana falha, a Justiça divina, de uma forma ou outra, age. Muitos já estão no inferno pagando pelas barbáries que cometeram durante o regime militar. Outros, ainda vivos, o inferno os espera. 






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