sexta-feira, 17 de outubro de 2014

A Iugoslávia é aqui

Quem assiste ao filme "Na Terra do Amor e do Ódio", dirigido magnificamente pela atriz norte-americana Angelina Jolie, retratando o conflito na antiga Iugoslávia nos anos 1990, tem uma imagem de como o ódio destruiu uma das mais belas nações do leste europeu. A Iugoslávia era conhecida como a "Suiça do Leste Europeu" e oferecia aos seus habitantes uma qualidade de vida das melhores. 
Um pouco antes do conflito, sérvios, muçulmanos e croatas conviviam harmoniosamente. Após o conflito, houve um massacre e o saldo foram 300 mil mortos, 50 mil estupros e várias lideranças enviadas ao Tribunal de Haia sendo condenadas por crimes de guerra. Houve um verdadeiro massacre dos muçulmanos. A Iugoslávia foi dividida em seis países e não existe mais. O ódio destruiu uma nação. Vários outros filmes retratam o absurdo do que aconteceu na antiga Iugoslávia, como "Terra de Ninguém", "O Resgate de Harrison", "Soldados - A História de Kosovo", "Benvindo a Sarajevo", e assim por diante. 
Esta introdução tem por objetivo mostrar que o Brasil foi contaminado pelo ódio e ninguém sabe onde isso vai parar. A história é dinâmica. Assim como na Iugoslávia, onde pouco tempo antes as pessoas conviviam harmoniosamente, de repente tudo virou das pernas aos ares e o país foi sacudido por onda de ódio tão grande que foi marcado por uma guerra civil que durou 10 anos com milhares de mortos e vítimas. Foi o maior conflito militar na Europa após as duas grandes guerras mundiais. 
A direita raivosa instiga o ódio no Brasil. Inicialmente, há um desprezo secular pelos nordestinos. Nestas eleições está sendo possível observar isso. O nordestino é tratado como pessoas ínfimas. Assim como acontece com as minorias, como são os casos dos homossexuais, e assim por diante. Pastores fundamentalistas urram seu ódio contra essas pessoas, tendo como destaque Malafaias e Everaldos. 
Negros, gays, judeus e nordestinos são as principais vítimas dos crimes de ódio que crescem no Brasil, sob as vistas grossas das autoridades e da sociedade civil, que muitas vezes tende a encarar manifestações de preconceito como liberdade de expressão ou atos de desequilibrados. No entanto, com a multiplicação do acesso à internet, a difusão de manifestações contra esses grupos ganharam terreno fértil. Desde 2002, a antropóloga Adriana Dias, professora da Universidade de Campinas (Unicamp), estuda a atuação dos grupos neonazistas no Brasil, que perseguem suas vítimas na web, principalmente nas redes sociais. 
No Brasil, apesar de séculos de escravidão de povos vindos da África, e a consequente discriminação velada destes mesmos que ainda hoje ocorre, não houve experiência semelhante àquela vivida em outras regiões do globo, onde um grupo resolve se voltar contra outro no sentido de deslocar ou mesmo exterminá-lo. Isso não significa que o país não careça de uma legislação que busque suprimir o discurso de ódio (que envolve em seu conteúdo o racismo, como o que sofre o negro no Brasil). De fato, não há ainda no Brasil legislação específica em relação ao discurso de ódio. 
Nestas eleições, o ódio se propagou de tal forma que entendo ser um processo irreversível e incontrolável. Os demônios foram soltos, e em História quando isso acontece, é o "olho da serpente". Francamente, temo muito tal fato. Na antiga Iugoslávia foi assim. Hoje temos um Brasil dividido. Muitas pessoas estão deixando de conversar com outras justamente porque têm esta ou aquela opção política. A situação pode ganhar contornos extremamente perigosos. Na Internet, por exemplo, várias pessoas sem qualquer tipo de conhecimento e claramente influenciados pelos grandes meios de comunicação, destilam diariamente situações de ódio. A Alemanha foi contaminada pelo ódio; a Iugoslávia também; e todos pudemos ver onde isso terminou. O Brasil, definitivamente, também convive com esta mácula. 

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